Capítulo 7- A chuva
Era uma manhã de segunda-feira. Miku despertou alegremente muito cedo, pois tinha um compromisso. Não era com a música, pois não iria trabalhar por ser um feriado; nem sequer ia compor uma música. O que ela iria fazer a deixava incomodada só de pensar. Era algo agradável, mas embaraçoso: ela sairia com Kaito, que apesar de ser seu empresário, era alto e muito bonito, tinha um físico forte e atraente e um sorriso caloroso. Certamente, Miku era muito sortuda, pois ele mesmo havia pedido para que eles saíssem juntos. Ela lembrava-se perfeitamente do seu rosto inocente e envergonhado quando ele a pediu para sair, e se lamentava por não ter dado uma de difícil. Mas a expressão do garoto parecia insistir e fazer seu coração palpitar, como se não houvesse como recusar.
‘’-Ah, Miku. Semana que vem tem feriado. O que você vai fazer?
-Não sei. Eu estava pensando em descansar.
-É mesmo... Você trabalha duro o dia todo, não é? Então acho que não devo te atrapalhar... Desanimou ele.
-Por quê? –Perguntou Miku, na expectativa de que o garoto a chamasse para fazer algo. –Tem alguma coisa que você queria me dizer?
Kaito ficou vermelho e nervoso. Depois, ele respondeu:
-Se-será que você quer sair comigo? -gaguejou ele.
Naquele momento, o coração de Miku acelerou, como se gritasse, aceitando. Tentando segurar suas emoções, ela disse:
-Legal. Por que não?
-Bom. Então tá. –Disse ele, controlando-se. Sua felicidade era tamanha. ’’
Miku foi logo tomar um banho. Não tirava Kaito de sua cabeça por um segundo sequer. Aquela era a primeira vez que um garoto a chamava para sair, uma experiência nova e interessante.
Saindo do chuveiro, aproveitou para se vestir bem e sair para procurar o lugar onde ambos marcaram de se encontrar. Como era de se esperar, a garota, sem conhecer bem o lugar, perdeu-se por alguns instantes, fazendo com que ela se atrasasse, apesar de carregar consigo um pequeno mapa.
Por pouco, a garota conseguiu chegar a tempo. Kaito esperava por ela totalmente imóvel, na calçada de uma avenida movimentada no centro de Tóquio. Ela não queria deixá-lo esperando por muito tempo; era tamanha falta de educação.
-Onii-chan! –Gritou ela, ao avistar Kaito ao longe.
-Oi, Miku. Chegou na hora.
-Mesmo?-Disse ela, respirando aflita e quase sem fôlego de tanto andar. - Eu me perdi tanto que pensei que ia me atrasar.
-Eu acho que era melhor eu ter te buscado, mas você insistiu para que a gente se encontrasse...
-Não se preocupe. É que eu tenho que me acostumar com a cidade, senão isso vai acontecer mais vezes. -Riu ela. - Não posso morar aqui sem conhecer o lugar.
Kaito concordou e disse:
-Aliás, Miku, você está muito bonita. Vamos andando?
-Obrigada. -Disse ela, com um grande sorriso no rosto.
‘’É por isso que eu o adoro! Ele é tão educado... ’’ Pensava Miku. Kaito estava devidamente bem vestido: apenas uma blusa de frio, calça jeans e uma camisa social. Nada muito diferente, mas o deixava extremamente bonito. Miku estava uma blusa de mangas longas eu uma minissaia, o que poderia ser um problema se fizesse frio.
No momento em que andavam pelas movimentadas ruas de Tóquio, Miku olhava para Kaito e pensava: ‘’ É uma pena que ele tenha um passado tão triste. Mas eu vou me esforçar para tentar fazer com que ele fique feliz’’. Ela lembrava claramente de quando ele falava de seu passado. O garoto tinha muitas lembranças tristes, provavelmente as únicas que passavam pela sua cabeça. Resolveu então quebrar o silêncio e perguntar:
-Onii-chan, você não sente saudades dos seus pais?
-Com certeza, Miku, mas eu não posso fazer nada nesse momento. Eles já se foram e eu tenho que tentar ser independente agora.
-Mas... Você não se sente só?
-Claro. Mas eu tenho a minha irmã.
-Ah, sim. Você disse que tinha uma irmã. Ela deve ser bonita.
-Sim, mas é um tanto sem juízo. Não é fácil lidar com ela.
Os dois fizeram silêncio enquanto caminhavam. Só era possível ouvir o barulho provocado pela agitação da cidade. Altos prédios com muitos anúncios tampavam completamente a visão do horizonte e criavam uma poluição visual. O barulho dos carros era infinito. A luz do sol era refletida pelas vidraças dos colossais prédios da cidade, o que abafava um pouco o clima. Apesar disso, o clima estava fresco, e o céu estava repleto de nuvens, causando nos jovens a dedução de que logo iria chover. Mas eles não tinham dúvida: Aquele dia era perfeito para sair, pois quase nunca tinham um descanso; caos, agitação eram suas rotinas.
-Aliás, por que você perguntou se eu me sinto sozinho?
-É que eu acho quase impossível você ser tão educado sem ter pai e mãe.
-Obrigado. Meu avô me educou, mas ele é muito competente. Ele nunca faria mal a mim.
-Que bom. Ela é mais nova ou mais velha que você?
-Ela é um ano mais velha que eu; eu tenho dezenove e ela tem vinte. Mas ainda somos muito unidos. Eu ainda não gosto quando alguém chega perto dela.
-Eu entendo. O meu irmão também tem ciúmes de mim. Se ele nos visse agora, ele iria direto perguntando que é você.
-É. Eu só quero protegê-la.
-Você deve ser um ótimo irmão.
-Nem tanto. Ela só está desempregada agora e eu só estou tentando ajudá-la.
-Viu? Você é um bom irmão. Mas por que ela está desempregada?
-Ela também é uma cantora e fez a mesma audição que você. Mas, como não foi aprovada, ela não conseguiu entrar para nenhuma gravadora depois.
-Estou sentindo pena dela. Nem fiz a segunda parte dos testes e já fui aprovada...
-Mas o fato de que você foi aprovada é muito bom. Não é culpa sua.
Mesmo com o consolo de Kaito, Miku ficou cabisbaixa, sentindo-se culpada. Talvez, se a gravadora tivesse dado uma segunda chance às pessoas que faziam o teste, talvez a irmã do garoto não precisasse passar por dificuldades.
-Miku, olhe para mim. Você acha que, se não fosse aprovada, nós teríamos nos conhecido e tudo isso teria acontecido? Nós já conversamos sobre isso.
Miku olhou nos profundos olhos azuis de Kaito, discretamente. Lentamente, ela concordou.
-E se estiver preocupada, não precisa ficar assim. Ela está morando comigo.
-Ainda bem.
Depois de algum tempo, após tanto caminhar, os dois chegaram a um grande parque de diversões, que felizmente não estava muito cheio. Porém, a diversão era imprevisível, já que o céu estava tão fechado e podia chover a qualquer momento.
Sem se importar com o clima nublado, ambos se divertiram como crianças. Kaito conseguiu um lindo ursinho de pelúcia e deu para Miku como lembrança.
O primeiro acontecimento do dia, ao contrário do que se esperava, não foi a chuva, como eles esperavam. Uma garotinha avistou Miku ao longe e olhava fixamente para o casal. Não era possível saber o que queria, mas era possível perceber que seu plano era maligno.
-Ei! –Gritou a garota para Miku.- Eu já te vi antes. Você é a Hatsune Miku?
-Shhh! Não grite! Meus fãs vão acabar me reconhecendo.
Era tarde demais. Pode-se dizer que todas as pessoas que estavam naquele parque, por mais que estivesse vazio, olhavam fixamente para ela. Alguns caminhavam em sua direção para pedir autógrafos. Mais e mais pessoas a cercavam, até a garota ser completamente amassada e sufocada entre tanta gente. Não acabava nunca a quantidade de pessoas que pareciam ser suas fãs. Miku não tinha mais espaço, era impossível até respirar. Ela havia tirado um dia do fim de semana para descansar, não para distribuir autógrafos. Logo tinha se transformado em uma catástrofe. Ao mesmo tempo, ficou impressionada com a quantidade de fãs que tivera, e de pessoas que a reconheceram, sinal de que sua fama só crescia.
Alguns instantes depois, sentiu-se puxada pelo braço. Mesmo sem saber quem a puxava, começou a correr, aflita, para longe da multidão. Miku daria tudo para fugir daqueles fãs desesperados, que a espremiam de tanta excitação. De repente, deu uma rápida olhada; como era de se esperar, era Kaito.
-Por que estamos saindo do parque?
Kaito não respondeu. Ele parecia poupar suas energias para conseguir correr e se esconder com Miku. Alguns fãs ainda tentavam perseguir a garota, tentando ainda conseguir seus autógrafos, mas logo desistiram.
Assim que saíram do parque em disparada, em direção a um pequeno bosque aberto e seguro, esconderam atrás de uma árvore, ofegantes pela corrida. Miku então recuperou o fôlego e disse:
-Ei! O que deu em você? Não precisava me puxar daquele jeito! –Gritava ela, irritada. Apesar de parecer inocente, Miku não dava o braço a torcer.
-Me desculpe, Miku. Mas você tinha que fugir. Se você distribuísse autógrafos para todos aqueles fãs, você iria acabar se transformando na atração do parque.
-Mas eu não posso ser amiga dos meus fãs?
-Nem de todos, Miku. Você viu como eles estavam exagerando e te cercando. Você tem que dizer não aos seus fãs de vez em quando, senão eles não vão te deixar fazer o que você tem que fazer. Pense mais em você mesma, Miku. Você é a prioridade.
-Mas isso é injusto...
-Nada no mundo dos famosos é justo. Me desculpe.
-Está tudo bem... –disse ela, cabisbaixa. - O que mais pode acontecer de ruim hoje?
De repente, várias gotas de chuva caíram do céu, uma após a outra, penetrando no solo entre as raízes das árvores.
-Vamos para aquela lanchonete logo ali para nos protegermos da chuva. –Disse Kaito, tirando sua blusa e colocando sobre os ombros da garota, para evitar que ela se molhasse. À medida que chegavam perto do toldo da lanchonete, a chuva aumentava. Miku olhava para um lado fixamente, distraída e parecendo triste.
-Me desculpe, Miku. Era para o nosso dia ter sido mais divertido.
-Não tem problema. A culpa não é sua.
A pequena lanchonete estava vazia. Alguns dos bancos estavam próximos a uma grande janela de vidro, o que atraiu Miku, que permaneceu sentada por um bom tempo, observando a chuva.
-O que foi? –Perguntou Kaito, preocupado.
Miku olhou para ele e abriu um leve sorriso.
-As coisas não deram muito certo, mas eu sei que você planejou esse passeio para tentar me alegrar. Muito obrigada.
-Talvez você tenha que ser mais cuidadosa daqui em diante.
-Por quê?
-Eu quero dizer que talvez nós tenhamos que nos disfarçar para podermos andar por aí. Talvez fosse melhor se parássemos de sair.
-Por quê?! – Perguntou ela, decepcionada.
-À medida que sua fama aumenta, sua liberdade diminui. Celebridades não podem andar pelas ruas como pessoas normais; elas acabam sendo flagradas pelas câmeras.
Miku apoiou seu queixo sobre a mesa, chateada.
-Não precisa ficar triste, Miku. Nós vamos encontrar coisas para fazermos juntos.
-É... Eu espero. Mas o que vamos fazer agora?
-Com essa chuva forte desse jeito, só podemos esperar baixar e ir embora.
-Não vou deixar nosso dia acabar assim. Eu tenho um guarda-chuva na minha bolsa. Vamos procurar algo pra fazer.
-Mas, mesmo se conseguirmos sair daqui, o que podemos fazer?
-Vamos ao cinema. –Disse ela, decididamente e momentaneamente.
-Tudo bem então.
Ambos saíram juntos debaixo daquela chuva infinita e fria, debaixo de um só guarda-chuva. A caminhada era longa; só os dois estavam na rua deserta. Havia também alguns poucos carros, a maioria estacionada. O céu estava muito cinzento e a cidade, sombriamente escura. Era possível escutar o relaxante som da chuva, junto aos passos de ambos que era abafados pela água da chuva que cobria as ruas e calçadas e ao som do alarme de carros à distância. De repente, Miku começou a espirrar, deixando Kaito preocupado.
Mais um tempo de longa caminhada os levou ao seu destino: o cinema. Era grande, espaçoso e escuro. Poltronas juntas e confortáveis eram alinhadas de maneira estratégica. Miku e Kaito sentaram-se. Não demorou muito para que Miku começasse a espirrar novamente, deixando Kaito preocupado. Porém, Sua preocupação acabou quando Miku adormeceu. Ele logo a cobriu com sua blusa e encostou a cabeça da garota sobre seu ombro, para que ela tivesse mais conforto. Ela dormiu durante o filme todo; apesar de querer se divertir mais tempo, com Kaito, estava derrotada pelo cansaço que se acumulou durante a semana.
Quando a sessão acabou, já era fim da tarde. Até Kaito mostrava-se um pouco cansado. Acordou a garota adormecida e ambos saíram da sala de cinema. Ela, ainda sonolenta, levantou-se com os olhos entreabertos e saiu da sala de cinema junto a Kaito completamente tonta.
Vendo a situação da garota, Kaito chamou um táxi para levar ambos em suas casas. Dentro do carro, Miku permanecia adormecida, sem sequer saber onde estava até acordar por um segundo, retomar sua consciência e perguntar, logo adormecer novamente.
O casal chegou à porta da casa de Miku. Mal enxergando as chaves para abrir a porta por causa do escuro, ela disse:
-Muito obrigada pelo passeio. Devíamos fazer isso mais vezes.
-Claro. Desculpe pelos imprevistos, Miku.
-Eu é que tenho que pedir desculpas por ter dormido.
-Não se preocupe. Eu entendo o quanto você estava cansada.
-Boa noite, onii-chan. Até amanhã.
-Boa noite. Durma bem.
Por um instante, Miku sorriu e acenou ao ver Kaito caminhando até o taxi e esperou até que ele fosse embora para entrar.